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12.Dezembro
A necessária e urgente quebra de patentes de vacinas (por Paulo Paim)


Enquanto os lucros aumentam, o acesso às vacinas é desigual e os mais prejudicados são os países pobres

Imunização avança no país, apesar da gestão federal da pandemia. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Paulo Paim (*)

Por uma questão humanitária, o veto de nº 48 da presidência da República ao projeto de lei nº 12/2021, que prevê a quebra temporária de patentes de vacinas e de medicamentos para uso no combate à covid-19, precisa ser derrubado urgentemente pelo Congresso Nacional.

A pandemia já matou mais de 616 mil pessoas no Brasil; estamos vacinando; mas muitos ainda precisam ser vacinados. No mundo todo foram, até o momento, mais de 5,3 milhão de óbitos.  Uma quarta onda está batendo às nossas portas. Há casos da variante ômicron em todos os continentes. Não podemos vacilar.

Os lucros não podem estar acima da vida humana; é muita crueldade, desumanidade; falta de solidariedade e de fraternidade. Algumas palavras do Papa Francisco ditas há mais de dois anos são atualíssimas e servem para a nossa reflexão de que outro mundo é possível.

– Toda vida humana é válida em si mesma e constitui um valor inestimável. Os ataques à dignidade e à vida infelizmente continuam em nossa era, que é a era dos direitos humanos universais. De fato, somos confrontados com novas ameaças e nova escravidão, e as leis nem sempre protegem a vida humana mais fraca e vulnerável.

Estima-se que somente três laboratórios que produzem vacinas contra covid-19 terão lucros somados, em 2021, de 34 bilhões de dólares. Isso significa 1000 dólares por segundo; 60 mil dólares por minuto; 93,5 milhões de dólares por dia. Esse levantamento foi feito pelo movimento People’s Vaccine Alliance e considera os relatórios sobre imunizantes divulgados pelos próprios laboratórios.

Um laboratório da Alemanha era avaliado, no início do ano, em 8,7 bilhões de dólares. Hoje, seu valor de mercado é de 28,6 bilhões. As ações nas bolsas sobem todos os dias.  Enquanto os lucros aumentam, o acesso às vacinas é desigual e os mais prejudicados são os países pobres. Apenas 2% das pessoas desses países foram totalmente vacinadas. Estão faltando imunizantes.

Segundo a plataforma Our World in Data, até o dia 18 de novembro de 2021, apenas 4,7% das pessoas em países de baixa renda receberam pelo menos uma dose. O acesso desigual aos imunizantes é mais explícito nos países do continente africano.

Enquanto isso, os dez países mais ricos possuem mais de 800 milhões de doses sem uso. Isso é inaceitável. O monopólio é um equívoco, uma aberração da ganância do homem; ele mata. Os contratos mais lucrativos são assinados com os países mais ricos. Quem tem dinheiro leva.

O Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) já pediu, por várias vezes, que os países ricos acelerem as doações prometidas; o que não ocorreu.  A pandemia só vai acabar quando todos estiverem imunizados; quando todos os lugares do mundo tiverem imunizantes e medicamentos.

O Diretor-Geral da OMS (Organização Mundial da Saúde) Tédros Adanon diz que o compartilhamento de dados, tecnologias e materiais biológicos pode ser acelerado com um eventual pacto entre países. Ele defende um chamado ‘tratado de pandemias’ para mitigar os impactos de futuras pandemias.

Essa posição está alinhada à derrubada do Veto 48. O Brasil será exemplo ao mundo. Teremos a possibilidade única de disponibilizar mais vacinas para os brasileiros e ajudar os países que necessitam e que dependem delas.

A derrubada do veto de nº 48 é um novo caminho contra a desigualdade de distribuição de vacinas e medicamentos. Ela vai garantir que os imunizantes sejam produzidos em tempo menor, de forma ágil; com preços bem menores; produtos genéricos. Ou seja, acesso a toda a humanidade.

Vale lembrar que os laboratórios não serão proibidos de vender as suas vacinas. Haverá, sim, a quebra temporária de patentes, que é justa, necessária, urgente. A vida deve estar sempre em primeiro lugar.

A nossa mentalidade precisa mudar; é uma condição mínima para termos esperança e combater os perigos que nos cercam.

O que é a vida humana? Qual o sentido da vida? O preço da vida humana é imensurável! Quando a vida humana é levada ao extremo da indignidade pelos governos é sinal que houve omissão, descaso, indecência. O caminho sempre é o genocídio, e ele chega silenciosamente. É contra isso que lutamos.

O grande escritor russo Fiódor Dostoiévski, no século 19, dizia que cada um de nós é culpado perante todos, por todos e por tudo.

(*) Senador (PT-RS), presidente da Comissão Mista Permanente sobre Migrações Internacionais e Refugiados do Congresso

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

    Fonte: Sul 21