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24.Abril
A vitória da persistência - Jornal Brasil Agora

Há 120 anos a princesa Isabel assinava a Lei Áurea. Não podemos esquecer que o Brasil foi o último país das Américas a libertar os negros escravizados. A esperança de um novo tempo, sem escravidão, era revelada por meio do entusiasmo dos abolicionistas e dos negros. Porém, aos poucos, a euforia deu lugar à realidade. Os negros libertos estavam sem emprego. Não ganharam terras como reparação pelos anos de trabalho forçado e pela Constituição brasileira era vedado ao povo negro o acesso à escola.Os anos se passaram e nós não nos cansamos de recordar essa parte de nossa história. Fazemos isso para reafirmar nossos conceitos, nossos valores, nosso espírito de luta. Há feridas que são curadas e outras em que as cicatrizes ficam para nos lembrar de fatos e ações que não devem ser repetidos. Hoje ainda existem os que não querem admitir que, apesar dos avanços da sociedade brasileira, ainda há muita discriminação, muito preconceito e racismo com a população negra. A maioria do povo negro permanece morando nas favelas. A juventude negra é uma das maiores vítimas da violência e não tem o acesso desejado aos estudos. Nas universidades apenas 5% dos alunos são negros.As mulheres negras, em sua maioria, trabalham como empregadas domésticas e não tem carteira de trabalho assinada. Há poucos negros no primeiro escalão, no Parlamento, no Executivo, no Legislativo, no Judiciário e nas Forças Armadas. O mesmo é verificado na área privada. São esses preconceito e racismo velados que queremos eliminar. O silêncio do preconceito choca, dói... e muito. Quem passa ou já passou por isso sabe o quanto machuca. Porém, felizmente, aos poucos esse silêncio está sendo quebrado por um tímido debate em torno do tema. Mesmo que alguns ousem dizer que não precisamos de políticas afirmativas. Em 13 de maio estaremos completando os 120 anos da abolição, uma abolição inconclusa. Queremos o envolvimento do Legislativo, do Judiciário, do Executivo e da sociedade como um todo em torno desse assunto. O objetivo é conclamar a todos para refletir sobre o tema, e colaborar para que os projetos que estão em tramitação no Congresso Nacional possam ser aprovados. Afinal, há no Legislativo propostas de todas as áreas e justamente aquelas relacionadas à discriminação e ao preconceito não são aprovadas.Por que não debater, discutir e aprovar propostas como o PL 73/99 que institui o sistema de cotas, de autoria da deputada Nice Lobão; a PEC 2/06, de nossa autoria, que institui o Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial; e o Estatuto da Igualdade Racial que contem uma série de ações a serem implantadas nas mais diversas áreas? O Estatuto prevê, entre outras coisas: o acesso universal e igualitário ao SUS; a obrigatoriedade de inserção nos currículos do ensino fundamental e médio da disciplina “História Geral da África e do Negro no Brasil”; que os remanescentes das comunidades quilombolas tenham direito à propriedade definitiva das terras que ocupavam; cotas nas universidades públicas e privadas, em concursos, em partidos e coligações, em filmes, programas televisivos e peças publicitárias; o reconhecimento do direito à liberdade de consciência e de crença dos afro-brasileiros e da dignidade dos cultos e religiões de matriz africana.Pode ser difícil alcançar a sociedade que sonhamos, livre de preconceitos e de qualquer tipo de discriminação, mas já provamos que somos persistentes, sobreviventes... Queremos continuar sonhando. Temos esperança de um dia termos políticas públicas que reparem as desigualdades. Temos esperança de que essas políticas tragam como conseqüência o respeito, o reconhecimento e a valorização dos negros e de sua importância dentro da sociedade. Mas, nossa principal meta é mudar as pessoas. Einstein disse certa vez que era mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito. As dificuldades podem até ser como barreiras, mas não são intransponíveis.Como dizia Robert H. Schüller, deixemos que nossas esperanças, e não nossos ferimentos, moldem nosso futuro. Senador PAULO PAIM (PT/RS)