Cerca de metade da população de nosso país é composta por afro-brasileiros. Mas, se as pesquisas realizadas não nos mostrassem isso, o que diríamos se apenas analisássemos o que a mídia nos mostra? Talvez tivéssemos a idéia de um país cuja população se assemelha fisicamente aos europeus. A verdade é que o Brasil é um país miscigenado e isso é o que deveríamos ter reproduzido em nossos meios de comunicação. Brancos, negros, índios, enfim, toda a diversidade racial representada sem que houvesse os tradicionais estereótipos. No caso da população afro-brasileira, percebemos que a experiência já teve início, mas de maneira muito tímida. A participação de negros na mídia está crescendo, porém, infelizmente, nós ainda ocupamos postos de menor destaque que os ocupados pelos não negros. Os programas de televisão, por exemplo, geralmente nos colocam representando profissionais com baixo prestígio social como, motoristas, empregadas domésticas e porteiros. As exceções são raras. Somos também os que representam a população das camadas mais pobres e os marginalizados. Há dois anos, o professor da Universidade de São Paulo, Hélio Santos, em entrevista ao Cinemando disse: "a mídia reflete os valores da sociedade. A sociedade brasileira é uma sociedade ibérica, que trabalha bem com os privilégios, trabalha de uma maneira muito eficaz no sentido de manter os privilégios. Logo, a mídia brasileira não poderia ser diferente do resto da sociedade, que discrimina o negro de uma maneira muito velada". Ou seja, a postura é cultural. Ainda temos em nossa sociedade resquícios dos conceitos pós- abolição. Essa é uma das razões que nos leva a defender a participação da mídia para que ocorra uma transformação cultural. Para que o posicionamento dos brasileiros em relação à população negra, independente da raça, seja alterado. A realidade social de nosso país, infelizmente, faz com que diversos grupos sejam prejudicados. Cabe a nós perceber isso e iniciar a mudança. Quantos de nós não conhecemos afro-brasileiros que ocupam postos de destaque? Médicos, advogados, artistas, esportistas, engenheiros, jornalistas, professores, políticos e tantos outros? Certamente muitos. Não inserindo afro-brasileiros nos mais diverso veículos e programas, a mídia contribui para aumentar a distância entre brancos e negros. Por que razão não podemos aparecer nos meios de comunicação de maneira semelhante aos descendentes de outras raças? Ao colocar afro-brasileiros representando papéis importantes - no caso de teatro, cinema e televisão, por exemplo-, a mídia estará contribuindo para que a população negra melhore sua auto-estima. A presença de negros nos meios de comunicação social é fundamental para a construção da imagem, da identidade de nosso povo . Contribui para que acreditemos que podemos alcançar novos postos. Para que nossas crianças tenham exemplos a seguir, para que se orgulhem de seu cabelo e da cor de sua pele. E, por outro lado, colabora para que os não negros aceitem a participação dos negros nos diversos campos. Foi com esse propósito que, há seis anos, propusemos cotas para a participação dos afro-brasileiros nos programas de televisão, no cinema, no teatro e nos anúncios publicitários. Medida que também consta na proposta de Estatuto da Igualdade Racial. O que vemos atualmente é que, por mais que estejamos avançando, a mídia ainda não reproduz a diversidade racial brasileira. É por essa razão que defendemos a adoção de algumas medidas via leis. A idéia é que, futuramente, as conquistas de hoje sejam direitos naturais aos negros e aos não negros. Acreditamos que o Estatuto seja aprovado em 2005, ano em que lembramos os 310 anos da morte de nosso grande herói Zumbi dos Palmares. Também no próximo ano, em novembro, estaremos realizando a Marcha sobre Brasília "Zumbi + 10". Esperamos que -a exemplo dos Estados Unidos que tem um feriado em homenagem a Martin Luther King-, possamos aprovar o dia 20 de novembro como feriado nacional. É válido ressaltar aqui que, enquanto a população norte-americana é composta por 11% de negros, o Brasil conta com mais de 50%. Assim, por que o 20 de novembro, data símbolo da liberdade do negro, não pode ser feriado? A intenção é que, nos próximos anos, nessa data possamos lembrar e debater questões ligadas à população negra. E, para isso, contarmos com o apoio das mídias escrita, falada, televisionada, enfim, para combatermos as discriminações ainda tão latentes neste país chamado Brasil. Senador Paulo Paim (PT-RS) Vice-presidente do Senado Federal e autor do projeto de lei nº 213/03 que institui o Estatuto da Igualdade Racial