Famílias de desaparecidos, OAB e representante da CNBB condenam sigilo na Comissão da Verdade A Comissão da Verdade deve divulgar documentos sigilosos do período da ditadura militar, na opinião de todos os convidados para debate realizado nesta terça-feira (18) na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). Ao analisar o projeto que cria a comissão (PLC 88/2011), os convidados pediram aos senadores que retirem do texto artigo que impede a divulgação de informações sigilosas que forem analisadas. Veja Mais Comissão da verdade: senadores querem permitir a punição de acusados de crimes contra direitos humanos Senadores querem fim de proibição de militares na Comissão da Verdade Senadores, entidades e familiares pedem outra Comissão da Verdade O projeto, de autoria do Executivo, foi aprovado pela Câmara e tramita agora no Senado. De acordo com o texto, a Comissão da Verdade terá como finalidade examinar e esclarecer as violações de direitos humanos praticadas entre 1946 e 1988, com objetivo de "efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional". No debate na CDH, representantes de entidades que reúnem parentes de presos políticos mortos e desaparecidos no Brasil defenderam que todos os arquivos sejam abertos para conhecimento público. A divulgação a toda a sociedade dos fatos ocorridos durante o regime militar também foi defendida por Marcus Vinícius Furtado Coelho, secretário geral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), e pelo padre Geraldo Martins, assessor político da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Marcus Vinícius também sugeriu que a Comissão da Verdade tenha composição plural, a exemplo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que conta com representantes da Câmara dos Deputados e do Senado. Para o representante da CNBB, as informações que resultarão do trabalho da comissão são essenciais para a formação das novas gerações. Conforme ressaltou, o país deve resgatar a memória do período de ditadura militar, "para que as atrocidades [cometidas na época] não ocorram mais". De acordo com o Padre Geraldo Martins, a CNBB apoia Comissão da Verdade, a qual, segundo ele, tem "a responsabilidade de não frustrar as expectativas daqueles que aguardam verdade dos fatos até hoje ocultados". Regime militar Susana Keniger Lisboa, da Comissão de Familiares de Mortos, e Iara Xavier Pereira, representante do Comitê pela Verdade, Memória e Justiça do Distrito Federal, pediram aos senadores que mudem o projeto para estabelecer o ano de 1964 como o início do período que será investigado, e não em 1946, como previsto no texto. A reivindicação foi apoiada por Gilda Carvalho, procuradora federal dos Direitos do Cidadão. Ela considera a mudança necessária para que a comissão "não perca o foco" e concentre as investigações sobre os atos do regime militar. Ao falar aos senadores, Aton Fon Filho, da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, pediu modificação de artigo que prevê a possibilidade de participação de militares na comissão. Ele argumenta que, se a regra for mantida, haverá dificuldades para o militar que integra a comissão interrogar um superior hierárquico chamado a depor. Todos os participantes da audiência pública ressaltaram a importância do debate, afirmando que as entidades não foram ouvidas quando da tramitação da matéria na Câmara. Além da pouca discussão do projeto, a deputada Luíza Erundina (PSB-SP) criticou a recusa, pela Câmara, de emendas propondo mudanças sugeridas pelas entidades de familiares de desaparecidos políticos. Iara Farias Borges / Agência Senado(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado) Comissão da Verdade: CDH realiza audiência pública A criação da Comissão Nacional da Verdade será tema de audiência pública na próxima terça-feira (18), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). De autoria do Executivo e já analisado pela Câmara dos Deputados, o PLC 88/11, que cria a comissão, tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). A apresentação do relatório do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) está prevista para a quarta-feira (19). De acordo com o texto aprovado pelos deputados, a Comissão da Verdade terá como finalidade examinar e esclarecer as violações de direitos humanos praticadas entre 1946 e 1988, com objetivo de "efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional". Para que a matéria fosse aprovada na Câmara no final de setembro, os deputados firmaram acordo pelo qual ficariam excluídos do grupo de investigação previsto no projeto tanto ex-torturadores quanto ex-terroristas. Depois de passar pela CCJ do Senado, o projeto ainda será analisado pela CDH e pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE). Porões O assunto é polêmico principalmente porque traz à tona conflitos políticos marcantes da história recente do país. Há remanescentes do regime militar (1964-1985) e parlamentares favoráveis à tese de que a Lei da Anistia pacificou o país. Não faria sentido, desse ponto de vista, investigar as denúncias de tortura, sequestro e morte de opositores da ditadura. Até porque, assinalam, os atos do regime teriam sido uma reação à luta armada empreendida por grupos de esquerda, da qual também resultaram mortes. Um dos casos mais controversos e emblemáticos desse período é o do jornalista Vladimir Herzog, morto em 1975 nas dependências do II Exército, em São Paulo. Em 24 de outubro daquele ano, o então diretor de jornalismo da TV Cultura foi convocado a prestar depoimento sobre suas ligações com o Partido Comunista Brasileiro (PCB). No dia seguinte, apareceu pendurado no que seria o cinto do seu macacão de preso. A causa oficial do óbito, divulgada pelo governo da época (Ernesto Geisel), foi suicídio por enforcamento. Essa versão, entretanto, vem sendo sistematicamente combatida com base em indícios de tortura e simulação. Nas fotos distribuídas pelo Exército, as pernas do jornalista aparecem dobradas, e não esticadas, como é o de se esperar nos enforcamentos. Duas marcas observadas no pescoço de Vladimir levaram amigos e familiares a crer que na verdade ele fora estrangulado. Segundo o grupo Tortura Nunca Mais, os militares "simularam seu suicídio, entregando à imprensa fotos do corpo de Herzog pendurado pelo pescoço à grade da cela por uma peça de roupa". Fotos de um preso nu entregues à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados em 1997 e publicadas em 2004 levantaram a suspeita de que se tratasse de registros de uma sessão de tortura em Vladimir Herzog. A suspeita, porém, não foi confirmada até hoje. Mesmo a viúva de Herzog, Clarice, que a princípio confirmou a identidade do marido, voltou atrás dias depois. A audiência da CDH está marcada para as 9horas na sala 2 da ala Senador Nilo Coelho. O requerimento para a realização do debate, do senador Paulo Paim (PT-RS), prevê os seguintes participantes: - Ophir Cavalcante, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); - Gilda Carvalho, procuradora federal dos Direitos do Cidadão; - João Vicente Goulart, filho do ex-presidente João Goulart; - Sueli Aparecida Bellato, assessora especial do Ministério da Justiça; - Iara Xavier Pereira, representantes do Comitê pela Verdade Memória e Justiça do Distrito Federal; - Aton Fon Filho, da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos; - Susana Keniger Lisboa, da Comissão de Familiares de Mortos. Da Redação / Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)