Aprovamos por unanimidade o PL nº 3198/2000, Estatuto da Igualdade Racial, na Comissão Especial destinada a apreciar e proferir parecer sobre a proposta. O projeto foi aprovado na forma do substitutivo do Relator Reginaldo Germano e os demais projetos foram, no mérito, rejeitados. Pela primeira vez na história do Brasil o Congresso Nacional abre as portas para a sociedade debater a questão do negro e das discriminações numa Comissão Especial para o assunto. É um fato de inquestionável valor histórico e muito mais do que isso, é o início de um longo processo de reparações, de discussões, de debates sobre um assunto que sempre foi escamoteado, foi tabu. Governos se sucederam, um após outro, esvaziando as propostas, disfarçando através de artifícios regimentais para fugir de uma dívida histórica, numa negação hipócrita da existência do preconceito. Nessa Comissão, que deveria ser permanente, temos uma oportunidade única de assumir nossa negritude como um todo e lutar por causas concretas. Muito do que se fez até hoje e tudo o que conseguimos é graças à mobilização dos nossos movimentos organizados. Queremos soluções concretas agora! Já! Neste instante! Há muito tempo ouvimos o mesmo discurso de que este é um processo de longo prazo e que é necessário alterar questões estruturais. Isso nós já sabemos. O que queremos é que o processo de mudanças estruturais seja acompanhado de mudanças conjunturais e imediatas, ou vamos esperar mais 500 anos? No Estatuto, foram definidos os termos utilizados na Lei: discriminação racial, desigualdades raciais, afro-brasileiros, políticas públicas e ações afirmativas. Além de reafirmar-se como dever do Estado e da sociedade a promoção da igualdade e apresenta-se a diretriz político-jurídica para o Estatuto. O Estado, nas suas três instâncias, deverá criar conselhos de defesa da igualdade racial para a formulação, coordenação, supervisão e avaliação das políticas de promoção da igualdade. No quesito saúde, reafirma-se o papel do Estado com a questão da saúde pública. Há a obrigação da introdução do quesito raça/cor em todos os documentos do uso do Sistema Único de Saúde, para a produção de dados estatísticos que propiciem uma avaliação específica da saúde dos negros no Brasil. Além disso haverá pesquisas de doenças prevalentes na população afro-brasileira e as formas de combatê-las. No capítulo referente à Educação, Cultura, Esporte e Lazer é reafirmado o direito da população afro-brasileira a atividades educativas, esportivas e de lazer e à fruição livre e criativa de sua cultura, estabelecendo tarefas para o poder público nessa área. Além disso são criadas linhas de pesquisa voltadas para relações raciais no Brasil, em particular, nas universidades, à coleta de dados sobre cor/raça no meio estudantil e à defesa contra o preconceito religioso e cultural que atinge populações afro-brasileiras. No que se refere à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício dos cultos religiosos, a população afro-brasileira tem a garantia da liberdade de escolha e de manisfestação, individual e coletiva, em público e privado, de filiação religiosa. Embora nossa Constituição garanta livre manifestação neste sentido, é imprescindível a inclusão deste aspecto, devido à realidade que a população afro-brasileira enfrenta no quesito preconceito. Um dos aspectos de mais destaque é o que se refere à indenização aos afro-brasileiros. Cria-se o Fundo de Promoção da Igualdade Racial para que o Estado brasileiro invista em diversas áreas prioritárias. A titulação das terras remanescentes fica assegurada, bem como a necessária preservação dos bens culturais dessas comunidades para garantir suas condições básicas de sobrevivência, respeitando o meio ambiente. O capítulo referente ao mercado de trabalho confere um tratamento amplo à questão do acesso ao emprego por parte dos afro-brasileiros, tendo em vista a redução das desigualdades raciais no âmbito do trabalho. Foram introduzidas políticas voltadas para a inclusão de afro-brasileiros no mercado de trabalho, contemplando o estabelecimento do princípio da contratação preferencial na esfera da administração pública e o estímulo para que este princípio se efetue também na esfera privada; implementação no âmbito do Fundo de Amparo ao Trabalhador, de políticas para a formação profissional e programas de geração de renda e emprego para afro-brasileiros. O Sistema de cotas foi incluído como importante recurso para corrigir as desigualdades sociais. A definição foi ampliada, estabelecendo cotas para concursos públicos e cursos de graduação nas instituições de ensino superior públicas e privadaO capítulo referente aos meios de comunicação tem como objetivo ampliar a veiculação pela mídia nacional, de imagens de afro-brasileiros, valorizando sua presença na formação histórica nacional e impedir que os veículos de comunicação sejam utilizados como meios de discriminação racial velada ou exposta. Cria-se a Ouvidoria de Defesa da Igualdade Racial no âmbito dos legislativos, para que o combate ao racismo e a fiscalização dos programas de promoção da igualdade racial tenham eficácia. O acesso à Justiça estará garantido através do Conselho Nacional de Defesa da Igualdade Racial, que elaborará um Programa Especial de Acesso à Justiça. Em nome de milhares de homens e mulheres que foram mortos e escravizados; em nome de todos os que sofrem com o dilema do preconceito velado nós lutamos pela aprovação deste projeto e que Deus ilumine a todos nós para que possamos, através da fiscalização deste e de outros instrumentos, erradicar o preconceito em nossa sociedade. " Paulo Paim PT/RS