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30.Setembro
Um soco em plenário

Briga em torno do regimento expõe disputa que marcaria a ConstituinteConservadores do lado direito do plenário. Progressistas, do esquerdo. No ambiente da Assembleia Nacional Constituinte, nervos aflorados. Era dezembro de 1987. O grupo multipartidário que se autodenominava Centrão, rebelado contra a nata intelectual esquerdista, dava uma cartada ousada para modificar o regimento interno, abrindo a possibilidade de rediscussão do projeto prévio de Constituição, de “tendência estatizante e utópica”, que estava apto a ser votado.A ala progressista esperneava, acusava o Centrão de tentar mudar as regras do jogo “para servir aos patrões e derrubar direitos dos trabalhadores”.Das galerias da Câmara dos Deputados, sindicalistas da CUT e da CGT cuspiam e jogavam moedas na direção dos integrantes do grupo conservador. A disputa pelos microfones, utilizados nos apartes, era crescente. Juarez Antunes (PDT-RJ) se dirigiu ao lado direito do plenário, reduto do Centrão. Ele queria ocupar o microfone, mas logo foi barrado por Gilson Machado (PFL-PE). Enérgico, Roberto Jefferson (PTB-RJ) peitou Antunes, com um empurrão.O clima esquentou de vez, apimentado por agressões verbais. O pedetista, revoltado, tentou acertar um pontapé nos opositores, mas acabou atingindo um colega de bancada. Mesmo sem ser tocado, Machado não titubeou e soltou um soco que atingiu em cheio o rosto de Antunes.– Todos estavam puxando e arrancando microfones. O Juarez Antunes chamou o pessoal do Centrão de safado e sem vergonha. Veio um baita cara do Centrão e deu um soco no meio da testa do Juarez. Ele caiu duro, bem na minha frente. Só pude ajudá-lo a levantar – recorda o então deputado federal Paulo Paim (PT-RS), hoje senador.A sessão teve de ser suspensa. Erguido pelos companheiros, o pedetista tentou avançar em direção ao agressor, mas foi contido. Minutos depois, os trabalhos foram retomados.O nocaute de Antunes foi o menos dolorido dos golpes sofridos pela esquerda naquele dia. Com 290 votos, o Centrão esmagou o bloco progressista, alterou o regimento e abriu a brecha para modificar o texto – aquele considerado “socialista” – apresentado pelo relator da Comissão de Sistematização, deputado Bernardo Cabral (PMDB-AM).– Foi um dia trágico, de derrota. O plenário estava lotado, levamos para lá os movimentos sociais – lembra, com pesar, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), uma então líder comunitária das favelas cariocas que havia chegado ao Congresso.A Assembleia Nacional Constituinte não seria mais a mesma após a rebelião dos conservadores, processo que deu origem ao Centrão. Mas a história da Constituição de 1988 começou anos antes, mais precisamente em 1984.   ZERO HORA