CORREIO BRASILIENSE - Artigo No ano de 2000 apresentei o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei Brasileira de Inclusão), sancionado no último 6 de julho pela Presidente Dilma Rousseff. Ele é um dos mais importantes instrumentos de emancipação civil e social dessa parcela da sociedade. Esse documento consolida as leis existentes e avança nos princípios da cidadania. Nesta década e meia de tramitação foram realizados mais de 1500 encontros: audiências públicas, seminários, consultas, conferências nacionais e regionais, com ampla participação da sociedade, de entidades e do movimento de pessoas com deficiência. Cerca de 46 milhões de brasileiros serão beneficiados nas mais diversas áreas: saúde, educação, trabalho, habilitação e reabilitação, transporte, turismo, lazer, acessibilidade em sua mais ampla especificidade. Nos seus 127 artigos temos os que penalizam aqueles que o descumprirem, imprimindo maior coerção à legislação. Alguns pontos em destaque: atendimento prioritário em situação de socorro; disponibilização de pontos de parada, estações e terminais acessíveis de transporte coletivo de passageiros e garantia de segurança no embarque e no desembarque; as frotas de empresas de táxis devem reservar 10% de veículos acessíveis, sem cobrança de tarifa adicional; as locadoras de automóveis devem oferecer 1 veículo adaptado a cada 20; hotéis e pousadas devem disponibilizar 10% de seus dormitórios com acessibilidade; reserva de 3% das unidades habitacionais que utilizarem recursos públicos; estímulo ao empreendedorismo e ao trabalho autônomo com disponibilidade de linhas de crédito; oferta de ensino em libras e braile no sistema público; espaços culturais e esportivos devem atender as normas de acessibilidade; entre outros. Tudo isso representa um enorme avanço na qualidade de vida dessas pessoas. A entrada em vigor da Lei Federal Nº 13.146/2015 não encerrará apenas a trajetória de um projeto de lei, mas será uma nova caminhada de um projeto de vida de pessoas quase invisíveis que, até então, eram esquecidas pela diversidade de sua própria história. O pensador Theodore Zeldin, em sua obra “Uma história íntima da humanidade”, diz que “vida alguma pode ser considerada plenamente vivida se não tiver se beneficiado de todos os encontros de que é capaz. Hoje, a esperança se sustenta, acima de tudo, pela perspectiva do encontro com novas pessoas”. Eu acredito que esse desejo que reside na alma de cada um de nós, por si só, move montanhas e aproxima corações. A nossa gente vem, ao longo dos últimos anos, se encontrando consigo mesma por meio do respeito às diferenças e às identidades. O Estatuto do Idoso, assim como os estatutos da Igualdade Racial, da Criança e do Adolescente e o da Juventude são divisores de água nessa evolução, uma vez que deixaram suas marcas neste belo momento da civilização brasileira, dos seus personagens reais, gente sofrida, de homens e mulheres das florestas, dos campos, das cidades, das areias do nosso litoral. O Estatuto da Pessoa com Deficiência nasceu justamente desses encontros e esperanças, dos anseios e sonhos de muitas vidas, das reflexões, do diálogo de pais e mães, filhos, irmãos, tios, avós, amigos, namorados que, lá atrás se entrelaçaram na busca de um mesmo horizonte, cumprindo um ideal, os mesmos caminhos como assim faz “o vento que vai para o sul, e faz seu giro para o norte”. Importante destacar o trabalho do CONADE, da Secretaria dos Direitos Humanos, por meio da então ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Políticas para Pessoas com Deficiência, do Movimento Nacional dos PCDs e dos relatores da matéria no Congresso Nacional: Flávio Arns, Celso Russomano, Mara Gabrilli e Romário Faria. Creio que o estatuto é uma nova forma de perceber o ser humano em sua força e fragilidade, uma nova forma de compreender que a diversidade é um traço que não tem que separar as pessoas, mas uni-las, num sentimento de identidade e pertencimento. De ir e vir pelos caminhos e espaços. Caminhamos, escalamos montanhas, atravessamos rios falquejando sonhos e esperanças... Estendendo a mão para as adversidades... Acreditando e tendo a certeza de que cada um de nós é um coletivo, e o coletivo é um todo, dentro de cada um de nós. A vida faz que aprendamos. Ela nos ensina que quando tudo parece dar errado sempre haverá um sol nascente. É claro que temos que fazer por ela. Temos que lapidar a pedra da sabedoria com maestria, ajustar seus ângulos, e, assim, calmamente as “boas-novas” iremos alcançar. Paulo Paim (PT/RS) - Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal.