Senhor Presidente,Senhoras e Senhores Senadores. Há um medo bastante presente na rotina dos operários deste País. Falo do medo de se acidentar, do receio de se ferir, ou de até perder a vida.Vivi esse medo nos meus tempos de metalúrgico e posso garantir que ele não era sem fundamento. Já vi um colega perder parte do braço por causa de um acidente com uma rosqueadeira e nunca irei me esquecer do que aconteceu.Não é preciso ver um braço mutilado para perceber o quanto a segurança no trabalho é importante. Não só para os que estão na fábrica, mas para qualquer um que esteja trabalhando. Um ambiente seguro é mais do que uma questão de bem-estar dos empregados; é uma questão de dignidade do ser humano.Por isso, quero para cumprimentar as pessoas que cuidam da proteção do trabalhador e para falar sobre a própria segurança do trabalho. Assim, quero primeiro me dirigir a você, profissional de segurança do trabalho, para enviar-lhe os meus mais sinceros agradecimentos. Suas ações salvam vidas e, graças a você, inúmeras pessoas não irão conhecer a dor de uma amputação, ou da perda de um ente querido. Por isso, aceite o “muito obrigado” deste velho metalúrgico, e saiba que o seu valor é reconhecido por muita gente. Senhor Presidente, Na mesma proporção em que eu me sinto agradecido aos Engenheiros e Técnicos de segurança do trabalho, sinto-me indignado pelo estado em que se encontra a proteção ao trabalhador no Brasil. Entre 2007 e 2013, de acordo com a Previdência Social, ocorreram cerca de 5 milhões de acidentes de trabalho no País. Por causa deles, quase 100 mil trabalhadores ficaram incapacitados de modo permanente, enquanto mais de 19 mil vieram a falecer. Ou seja, nesse período, a cada ano aconteceram 715 mil acidentes de trabalho; a cada dia, 39 pessoas ficaram incapacitadas para o resto da vida e, a cada três horas, um trabalhador morreu. Nossa mortalidade no trabalho é comparável à de uma guerra. Em 2014, o conflito entre israelenses e palestinos levou à morte 2.300 pessoas, no ano mais sangrento em quase três décadas de hostilidades. Aqui, em 2013, os acidentes de trabalho eliminaram cerca de 3 mil vidas. Ao que tudo indica, os campos de batalha em Israel e na Palestina são menos letais do que o chão de fábrica no Brasil. Muito me dói dizer que o Rio Grande do Sul tem papel de destaque nessa conjuntura assustadora. Nós, gaúchos, ganhamos uma triste medalha de bronze nas estatísticas de acidentes de trabalho, com quase 60 mil companheiros vitimados em 2013. Naquele ano, nosso Rio Grande ficou atrás apenas de São Paulo, com quase 250 mil ocorrências, e Minas Gerais, que teve pouco menos de 80 mil acidentados. Senhoras e Senhores, Esse mar de feridos traz enormes perdas para o País.Segundo o sociólogo José Pastore, os custos vinculados a acidentes e doenças de trabalho no Brasil alcançaram 71 bilhões de reais, em 2009. Uma cifra astronômica, correspondente a quase seis vezes o custeio do programa Bolsa Família naquele mesmo ano. Embora seja gigantesco, e inclua as despesas do governo, das famílias e das empresas, trata-se de um cálculo subestimado, ... ... pois não considera os dispêndios referentes aos trabalhadores informais, ocupantes de metade dos empregos no País. Apesar das dimensões dos prejuízos causados pelos acidentes e doenças do trabalho, existem muitos obstáculos à solução desse problema. Um deles é a fiscalização insuficiente feita pelo poder público. Hoje contamos com menos de 2.800 fiscais do trabalho inspecionando as atividades de 95 milhões de trabalhadores. O ideal seria haver entre 5 mil e 9 mil fiscais atuando em todo o Brasil. Tal carência de profissionais favorece a perpetuação de práticas inadequadas e ambientes laborais inseguros para o trabalhador.Outro entrave é a falta de coordenação entre os Ministérios do Trabalho, da Saúde e da Previdência Social. Uma atuação mais coesa dessas três pastas, que tornasse prioritária a segurança do trabalhador, traria resultados substancialmente melhores para o bem-estar de quem trabalha. Além disso, o governo contribui para o alto índice de acidentes, ao financiar empresas sem exigir delas garantias à segurança dos empregados. Assim, o poder público termina por estimular, via subsídios, a ocorrência de novos acidentes. Senhor Presidente, O fato é que a saúde dos trabalhadores é secundária, diante da busca desenfreada pelo lucro. Garantir um ambiente de trabalho mais seguro demanda custos maiores, e os empresários se mostram pouco dispostos a diminuir seus ganhos. É o que acontece em relação à Norma Regulamentadora nº 12, do Ministério do Trabalho. Conhecida como NR-12, ela determina a implantação de melhorias em máquinas e equipamentos, visando prevenir acidentes com seus operadores.Por obrigar a adaptação de maquinário novo ou usado, a NR-12 encontra-se sob a mira dos empresários. Segundo a CNI, as adequações exigidas pela NR-12 chegariam a 100 bilhões de reais, causando retração na economia no País. Aliás, a justificativa econômica está presente no Projeto de Decreto Legislativo nº 1.408/2013, que propõe a sustação dessa norma. Sustar a NR-12 significa dizer que os lucros dos patrões não podem ser cortados, mas as mãos dos empregados, sim. Essa é uma inversão de valores absurda e inaceitável.Seguindo a linha de redução de custos, a terceirização de mão de obra é uma ameaça extra à segurança do trabalhador. Segundo um estudo do Dieese e da CUT, os terceirizados estão muito mais sujeitos a acidentes e mortes no trabalho do que os empregados sob contratação direta. Isso se explica por um treinamento inadequado dos terceirizados, além do baixo investimento em segurança pelas firmas de terceirização. Novamente o lucro tem prioridade sobre a vida, num quadro desanimador. Apesar de tudo isso, Senhoras e Senhores, há luz no fim do túnel. Ainda existe remédio para essa situação. O Ministério Público do Trabalho (MPT) tem mostrado uma atuação louvável na busca de condições decentes de segurança para o trabalhador. São inúmeras as ações ajuizadas e os termos de ajustamento de conduta propostos pelo MPT, com o objetivo de sanar danos causados por empresas que negligenciam a segurança no ambiente laboral. Por sua vez, a Advocacia-Geral da União (AGU) tem proposto ações contra empresas que, por negligência ou descumprimento de normas, contribuíram para a ocorrência de acidentes. Nesses casos, ela cobra dos empregadores os gastos feitos pela previdência com os trabalhadores acidentados. Perto de 730 milhões de reais em ressarcimentos foram ajuizados pela AGU, e mais de 10 milhões de reais retornaram aos cofres públicos desde 2010. Lançar os custos da negligência na conta das empresas infratoras é uma ótima maneira de alterar a mentalidade do empresariado nacional.Senhor Presidente, Precisamos garantir que a linha combativa do MPT e da AGU se torne o padrão para todo o poder público. Como eu já disse aqui, as pastas do Trabalho e Previdência Social, e da Saúde têm de operar em harmonia, ... ... de modo a viabilizar um sistema de segurança no trabalho mais eficaz, apto a proteger aqueles que dão o suor pelo Brasil.Acima de tudo, o lucro desmedido precisa deixar de ser a maior prioridade. Enquanto o dinheiro falar mais alto, construiremos nosso desenvolvimento sobre dedos amputados, colunas fraturadas e vidas partidas. Essa não pode ser a marca de um País que almeja o protagonismo mundial. Essa não pode ser a marca do Brasil.Era o que eu tinha a dizer. Sala das Sessões, 30 de novembro de 2015.Senador Paulo Paim.