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19.Fevereiro
A inquietude de Francisco - Correio Brasiliense

Simples nos gestos e sereno como o planar dos pássaros, mas com uma inquietação interna avassaladora. Assim é o papa Francisco. Muito mais do que a expressão máxima da Igreja Católica, ele é, com suas palavras, atitudes e ações um líder da humanidade. Sua sabedoria é fascinante. Sou atraído pelo seu jeito diligente de buscar caminhos para o bem da civilização e para a paz mundial. Ele ensina que o horizonte de amizade entre as nações está logo ali. Basta querer. Mas atenção. A sua verdade, necessariamente, não é a dos outros. Mas ela é encantadoramente honesta.Até pouco tempo ninguém acreditava que Estados Unidos e Cuba poderiam dialogar como irmãos. E não é que isso aconteceu? Com certeza, foi o primeiro passo de uma longa caminhada. Após 53 anos de rompimento diplomático, as duas nações resolveram reatar relações com perspectivas reais de integração social e econômica, ajuda mútua e respeito as diversidades. Francisco estava lá, encorajando os dois lados, sendo decisivo na mediação e na tão sonhada pacificação.Durante a 70ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro passado, ele surpreendeu ao pedir uma reforma da ONU. “A experiência desses 70 anos demonstra que reforma e adaptação aos novos tempos são sempre necessários, progredindo até o objetivo final de conceder a todos os países, sem exceção, uma participação e uma incidência igual nas decisões.”Ele especifica mais a sua proposição apontando que os órgãos financeiros mundiais não podem atuar de forma abusiva, especialmente contra países em desenvolvimento. “Os organismos devem vigiar a ordem do desenvolvimento sustentável dos países para evitar uma asfixiante submissão de tais nações aos sistemas de crédito que, bem longe de promoverem o progresso, submetem as populações a mecanismos de maiores pobrezas, exclusão e dependência.”As políticas das nações e dos blocos econômicos são míopes, segundo ele, a ponto de apagar de vista o horizonte de felicidade dos povos. É preciso inverter esta lógica e incluir as pessoas dentro de um projeto coletivo de bem-estar.A história mostra que renunciar o investimento nas pessoas para obter maior receita imediata é um deplorável negócio. É a lógica do descartável. Leva à exploração das crianças, ao abandono dos idosos e aposentados, ao trabalho escravo, à violência, à precarização do cotidiano, à retirada de direitos sociais e trabalhistas.Francisco nos ensina que a humanidade tem que estar sintonizada na descoberta de um novo modo de vida. Os homens têm que se sentir intimamente conectados a tudo que Deus criou. Se isso for entendido e esperançado, teremos uma tríade imbatível: meio ambiente, economia e social. Na encíclica Laudato si, o grande desafio é o de proteger a “casa comum” — o planeta Terra. Mas o que é o nosso planeta, se não as pessoas, a fauna, a flora, os alimentos, o trabalho, a economia, a vida. Por isso é necessário harmonizar tudo isso.No meio de todo esse turbilhão, o papa Francisco ainda aponta que o político tem que ter coragem para denunciar os vícios do poder e defender os valores da democracia social. Eu acrescento: não há espaço para a corrupção, pois ela mata e aniquila o sonho de milhões de pessoas.A inquietude de Francisco está sensibilizando o coletivo, legitimando, por assim dizer, nova mensagem e outro olhar repleto de esperança. Uma verdadeira revolução fraternal. É com esse espírito que a humanidade tem ainda a capacidade de colaborar na construção da nossa casa comum.  Portanto, não seria descabido se, no final de 2016, o papa Francisco fosse acarinhado com o Nobel da Paz.Senador Paulo Paim (PT/RS). Correio Brasiliense