Uma mudança na
atual legislação para garantir os diretos já assegurados às pessoas com
deficiência auditiva nos dois ouvidos também aos deficientes unilaterais
dividiu opiniões, durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e
Legislação Participativa (CDH), nesta segunda-feira (10).
O senador
Paulo Paim (PT-RS), relator do projeto de lei da Câmara (PLC 23/2016) que
inclui os deficientes auditivos unilaterais como pessoa com deficiência para
esses efeitos legais — hoje, eles são excluídos graças ao Decreto 5.296, de
2004 —, propôs que os participantes da audiência se reúnam novamente com ele,
na próxima quinta-feira (13), para tentar ajustar uma redação ideal para a
proposta. A reunião de trabalho deve ocorrer, conforme ajustou Paim, a partir
das 9h, na sala 2 da ala Nilo Coelho.
— Tenho a
tendência, como relator, de querer construir uma alternativa, um entendimento.
Vamos fazer o bom diálogo — propôs.
Os defensores
da alteração afirmam que os deficientes de apenas um ouvido vivem em um
"limbo", preteridos quando enfrentam a concorrência, mas sem o
direito de usufruir de benesses como a Lei de Cotas (Lei 8.213/1991). Já os
contrários ponderaram que a aprovação será um retrocesso, afetará a Lei
Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI - 13.146/2015) e trará
consequências para a contratação de surdos bilaterais, pois o mercado de
trabalho sempre dará preferência ao deficiente que demande menos gastos com
adaptações e treinamentos.
Inclusão
Durante o debate, os defensores da inclusão dos deficientes
unilaterais apontaram as dificuldades enfrentadas por eles. Eles são
prejudicados no mercado de trabalho quando enfrentam a ampla concorrência, mas
também não têm acesso às leis inclusivas, por isso defenderam o “alargamento do
conceito”.
O médico otologista Krishnamurti Sarmento Junior mencionou
artigos e estudos publicados em revistas médicas que asseguram existirem
prejuízos para o desenvolvimento, até a vida adulta, das crianças com
deficiência em apenas um ouvido. Segundo ele, habilidades da fala, desempenho
acadêmico, interação social, funções cognitivas, tudo isso é prejudicado pela
surdez unilateral.
— Não se trata de comparar deficiências, a gente não tem dúvida
de que um surdo bilateral tem dificuldades maiores, até pela barreira da
língua. O unilateral é oralizado, domina a língua falada. Mas isso não
significa que o unilateral não tenha uma deficiência — disse.
Luciano Fernandes, porta voz dos deficientes unilaterais,
lembrou que a deficiência em só um ouvido corresponde à definição de pessoa com
deficiência proclamada pela Organização das Nações Unidas (ONU). Também citou
que o projeto reinclui os deficientes auditivos unilaterais entre as pessoas com
deficiência, como era antes do Decreto de 2004, e salientou não haver essa
diferenciação legal para quem tem perda visual em apenas um olho, por exemplo.
Lei Brasileira de Inclusão
De acordo com Filipe Trigueiro, representante do Conselho
Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade), o projeto de lei,
caso seja aprovado, poderá revogar a Lei Brasileira de Inclusão. Ele teme até
que a iniciativa seja inconstitucional.
— [Aprovar o projeto] pode ser uma perda significativa. Temos
que fazer essa avaliação e entender a questão das brechas na jurisdição —
disse.
Na opinião de Fernanda Di Cavalcanti, também representante do
Conade e responsável pelo projeto de fiscalização da Lei de Cotas, a LBI vai
permitir mais evolução na defesa dos que realmente necessitam usar a cota. Esse
modelo entrará em vigor em 2018, explicou. Ela condenou a tentativa de mudança
na lei, e disse já existirem instrumentos jurídicos suficientes para garantir
os direitos das pessoas com deficiência, o problema é colocar em prática.
— Hoje, você pode ser uma pessoa com deficiência e evoluir para
não ser mais. Quando você restringe esses conceitos para uma lei, não faz parte
da evolução que o Brasil e o movimento têm sobre o conceito — avaliou.
A integrante do Conade lembrou ainda que no país, existem
políticas públicas que não são restritivas, como o acesso à saúde e à educação,
o que não é o caso da de cotas. O intuito desta é o de ajudar as pessoas que
necessitam de um diferencial para entrar no mercado de trabalho.
— Se ela não for restritiva, enquanto houver uma pessoa com
deficiência mais leve, a mais pesada vai ser preterida no mercado de trabalho —
afirmou.
Assista à íntegra: https://youtu.be/UG0J4E_Gvho?list=PLLLnytnGoqiYDYv8sAiyOkKc6gNCtBhMD