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29.Outubro
Cantando as Diferenças na Região das Missões - Relatório

 No dia 26 de outubro, sexta-feira passada, estivemos no município de São Miguel das Missões, único Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade do Rio Grande do Sul e do Sul do Brasil. Lá lançamos o Programa Cantando as Diferenças para a Região Missioneira, que está situada no noroeste do Estado, na fronteira com a Argentina. A partir das 13:30 artistas de toda a região estiveram apresentando-se. A APAE local e o Coral Indígena Guarani de São Miguel das Missões finalizaram os números artísticos. Em seqüência o Prefeito em exercício, José Roberto de Oliveira, cumprimentou as milhares de pessoas que estavam representando os prefeitos da região, vereadores da região, secretários municipais, Sindicatos de trabalhadores urbanos e rurais, representantes de Apaes, professores e alunos de escolas do município e região, grupos de terceira idade, índios, crianças e terceiro setor e movimentos sociais. Após explanei os objetivos do programa Cantando as Diferenças.......... Na tradicional palestra da instalação do programa, falou o Prefeito José Roberto de Oliveira sobre o tema “A Vida vem da História”, onde enfatizou a História das Missões, a importância dela para a humanidade dizendo que no momento em que o mundo esta procurando encontrar um caminho para resolver os problemas da exclusão, estavamos em frente à Catedral da Inclusão. Uma das mais emocionantes histórias da humanidade ocorreu nas fronteiras do Mercosul. Área hoje formada pelas divisas do Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Entre os anos 1609 e 1768, durante 160 anos, Padres Jesuítas e índios Guaranis construíram um novo caminho para a humanidade. Fundaram, na primeira fase, sua Província Modelo nas Regiões do Tape (RS), Itatim (MS) e Guairá (PR), as quais foram atacadas pelos bandeirantes na tentativa de levar os índios como escravos, sendo que milhares deles acabaram nas lavouras de São Paulo. Após vários ataques em 1637, migraram para a região entre o Rio Uruguai e o Rio Paraná. Retornaram para o lado esquerdo do Rio Uruguai a partir de 1682. Desse momento em diante se passaram mais de 70 anos de tranqüilidade, onde o projeto pôde crescer. Paul Lafargue, em conjunto com Bernstein, Kautski, Plechanov explica que o projeto constituiu um das experiências mais extraordinárias, que jamais tiveram lugar. Também Charlevoix e Muratori reconheceram-na como um modelo sem precedentes de sociedade cristã. A revista Lês Lettres Edificantes et Curieuses, dirigida pelos jesuítas, comparava os guaranis aos primeiros cristãos e descrevia suas comunidades como a realização ideal do cristianismo. Voltaire afirmou que o projeto Jesuítico-Guarani foi um “triunfo da humanidade”. O Abade Carbonel chamou de “coletivismo espontâneo”. Pablo Hernandez na Organización Social de lãs Doctrinas Guaranies, escreve que o maravilhoso surge a cada passo. O filósofo Rayal escreveu: Aí se observavam as leis, reinava uma civilidade exata, os costumes eram puros, uma fraternidade feliz unia os corações, todas as artes de necessidade estavam aperfeiçoadas. A abundância era ai universal. A República Guarani teve a graça das crianças, uma pureza repleta de candura. O mundo novo que estamos procurando realizar não pode menosprezar a lição fornecida. É importante lembrar que o Estado Jesuítico Guarani ocorreu em meio à escravidão exercida no mundo português e as encomendas no mundo espanhol, servindo como área protegida aos nativos que se instalavam nas Reduções.Com o deslocamento das reduções e a conseqüente exploração dos ervais, madeiras preciosas e estâncias, ocorreu o desenvolvimento. A localização final ficou estabelecida com oito reduções onde hoje está o Paraguai, 15 na Argentina, nas Províncias de Misiones e Corrientes e finalmente Sete do lado brasileiro, no noroeste do Rio Grande do Sul, onde hoje chamamos de Região das Missões. O número de habitantes chegou a quase 150.000. Quanto à agricultura os índios tiveram que abandonar a vida nômade para se fixarem às reduções, as condições do território eram de excelentes terras. O clima era saudável. Canais de irrigação levavam a água aos campos. Cada redução tinha no mínimo oito imensas hortas comunais, os pomares estavam povoados de frutas. Foram concebidas e fabricadas as ferramentas necessárias. Muito rapidamente, as reduções constituíram o conjunto agrícola mais completo e melhor organizado da América. Quanto à pecuária só São Miguel abatia 40 rezes por dia para o consumo dos habitantes. Charlevoix assegura que o mérito do êxito alcançado cabia aos guaranis, como aos missionários da Companhia. No princípio produziram vestuário, habitação, ferramentas agrícolas e transportes, as forjas e fundições vieram depois e tiveram muito sucesso. Todas as profissões artesanais tinham sido introduzidas e prosperavam. Fabricavam relógios, clarinetes, trompetes e tantos outros como nas melhores fábricas da Europa. A primeira oficina de impressão da Prata foi da República Guarani. Triunfaram em todas as artes. Montesquieu diz que o Estado Guarani foi o único estado industrial daquele período na América do Sul. Fundiram o ferro a partir das rochas encontradas na região e chegaram à siderurgia do aço. Nas artes o Barroco fez-se pleno, mostravam-se sensíveis e acessíveis, possuíam naturalmente ouvido apurado e um singular gosto pela harmonia, aprenderam a tocar todo o tipo de instrumento, compunham músicas. O Padre Ripário diz que se não tivesse à vista os músicos acreditar-se-ia que as melhores orquestras da Europa estavam de passagem pelas Índias. Quanto à pintura e escultura eram de excelente qualidade. O abastecimento, a armazenagem de produtos e sua distribuição eram assegurados pelos serviços comunais, sem qualquer intermediário comercial privado. A população obtinha os artigos sem dinheiro, nem qualquer espécie de moeda. Muratori afirmou que “Um dos mais sólidos fundamentos da paz e da união que reinam entre estes índios é a privação completa em que estão de espécies de ouro e prata, assim como em qualquer espécie de moeda”. A profissão de comerciante não existia. O comércio externo era coordenado por um padre que estava em Buenos Aires, o transporte fazia-se principalmente por via fluvial em barcos à vela ou remo. Uma rede de estradas pavimentadas também fora criada. Os principais artigos exportados pelas reduções eram o mate, o fumo, o algodão, o açúcar, os tecidos de algodão, os bordados, as rendas, os objetos trabalhados em torno, mesas, armários, e baús de madeiras preciosas, esculturas, peles, curtumes e arreios de couro, rosários e escapulários, mel, frutas de todas as espécies, cavalos, mulas, e carneiros, assim como e excedente de diversas indústrias. Todos eram vendidos à Europa, Corrientes, Santa Fé e Vila Rica. Importavam produtos manufaturados e metais. Toda a produção era orientada para a satisfação das necessidades do todo. Quanto à questão da propriedade o Padre Florentin de Bourges diz: “todo o solo pertencia à comunidade e era indivisível. Os bens são comuns, a ambição e a avareza são vícios desconhecidos, e não se registra entre eles litígios nem processos de divisão... Nada me pareceu mais belo do que a maneira como se provê à subsistência de todos os habitantes do povoado. Os que fazem à colheita são obrigados a transportar todo o cereal para os armazéns públicos, seguidamente funcionários fazem a distribuição pelos chefes de bairro, e estes pelas famílias, dando a cada uma, mais ou menos, segundo seja ela mais ou menos numerosa”. Quanto ao trabalho, em regra os guaranis não trabalhavam mais do que 6 horas diárias. De manhã os grupos desfilavam nas ruas e dirigiam-se para o campo ao som da flauta e do tambor, transportando com grande pompa a imagem de Santo Isidro, patrono dos agricultores. Pela tarde, no regresso, cantavam em coro suas canções de marcha. Para a avaliação do trabalho, em geral, bastava acompanhar o ritmo médio. Aquele que não quer trabalhar não deve comer, aquele que não pode trabalhar deve comer. Os velhos, viúvas, órfãos, doentes eram mantidos a expensas da comunidade. Em uma carta dirigida ao governador de Buenos Aires, logo após a expulsão dos Padres, o Cabildo de São Luis diz: “Não somos escravos e queremos fazer ver que não gostamos do costume espanhol que quer “cada um por si”, em vez de se ajudarem mutuamente em seus trabalhos cotidianos”. Adoravam o teatro e a dança, organizando grandes apresentações. O jogo de bola recebia todas as atenções, conforme o Padre Cardiel, os guaranis foram efetivamente os inventores do futebol, as bolas eram de borracha, feitas de resina de madeira. Jogavam com os pés. A educação recebia uma atenção muito especial, pois dependia a prosperidade da República. Todas as crianças eram obrigadas a ir à escola. A igualdade notava-se pelo vestuário. Homens e mulheres recebiam em princípio, um trajo por ano, as crianças dois. O tecido e o corte eram uniformes para todos. O mesmo princípio de igualdade fazia com que não houvesse pobres entres eles. Em 1750 a República Guarani parecia ter atingido o seu mais alto ponto de esplendor. A cédula real de 1743 reconhecia seu lealismo e devoção à Coroa, porém em 13 de janeiro de 1750 ocorre o Tratado de Madri, que trocava os 7 Povos do lado esquerdo do Rio Uruguai pela Colônia de Sacramento, portuguesa, levando à Guerra Guaranítica ocorrida entre os anos 1754 a 1756, onde no dia 7 de fevereiro ocorre a morte do Cacique Sepé Tiaraju e no dia 10 a Batalha de Caiboaté, com a morte de 1500 índios, rompendo a segurança das Reduções, resultando na tomada pelos exércitos de Portugal e Espanha. O Padre Raynal diz que um governo em que ninguém está ocioso, em que ninguém está sujeito a excesso de trabalho, em que o alimento é tão abundante, igual para todos os cidadãos, que são comodamente alojados e vestidos; em que os velhos, as viúvas, os órfãos, os doentes, têm socorros desconhecidos no resto da terra, em que toda a gente se casa por escolha, sem interesse, em que a multidão de crianças é uma consolação, sem poder ser um encargo... Aí está o suave império da opinião. A lição ensinada não pode ser esquecida. Hoje em 2007, 240 anos depois do encerramento do projeto procuramos um caminho para a inclusão social e política de índios, negros, pobres, velhos, pessoas especiais e tantos outros. Não esqueçamos da lição que a história deixou para a vida. Lá observei as energias que ainda estão tão presentes do herói Sepé Tiaraju e de toda a herança que aquele povo esquecido tem para oferecer para o mundo. É verdade que essas histórias fantásticas que o mundo conhece nós nesse nosso Brasil, tão pouco sabemos. No final do evento tivemos uma audiência pública em fente ao Patrimônio Mundial, onde foram apresentados documentos sobre uma calamidade que apresentou-se no dia 20 desse mês, que atingiu todo o noroeste do Estado, onde através de grandes pedras de granizo destruíram milhares e milhares de casas. Somente em São Miguel das Missões foram destelhadas 1500 casas, sendo que 800 de famílias abaixo da linha de pobreza. Em municípios como Santo Antônio das Missões foram 4.000 casas, uma verdadeira desgraça para a economia da região, pois além das casas também se foram as lavouras, morreram animais e até mesmo pessoas. Quanto a PLS 215, que é minha lei que tramita nesta casa e já está aprovada na Comissão de Educação, recebi vários pedidos insistentes que a Universidade Federal se faça nas Missões.