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29.Outubro
Pronunciamento sobre o Cantando as Diferenças na região das Missões (RS)

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, Na última sexta-feira estivemos no município gaúcho de São Miguel das Missões para lançar o Programa Cantando as Diferenças. Mais de duas mil pessoas estiveram presentes e contamos com uma belíssima apresentação dos índios Guaranis. Eles pediram-me que trabalhe pela aprovação do PLS 215, projeto de minha autoria que tramita nesta Casa e já foi aprovado na Comissão de Educação, e que cria a Universidade Federal das Missões. Senhoras e senhores senadores, A intenção é que o Cantando as Diferenças alcance toda a região Missioneira, situada no noroeste do Estado, na fronteira com a Argentina. Queremos integrar aqueles que, ao longo dos anos, foram deixados à margem da sociedade. Por isso, foi com satisfação que recebemos no evento representantes de administrações locais da região, vereadores, secretários municipais, de Sindicatos de trabalhadores urbanos e rurais,... ... de Apaes, professores e alunos de escolas do município, grupos de terceira idade, índios, crianças e representantes do terceiro setor e dos movimentos sociais. Contamos com o apoio do prefeito em exercício, José Roberto de Oliveira, que, na abertura do evento, falou sobre “A Vida vem da História”. Senadoras e senadores, Aqui farei um breve relato da história da região para que se entenda a razão da implantação do Cantando as Diferenças na localidade. Entre os anos 1609 e 1768, durante 160 anos, Padres Jesuítas e índios Guaranis fundaram, na primeira fase, a Província Modelo nas Regiões do Tape (RS), Itatim (MS) e Guairá (PR). Regiões que foram atacadas pelos Bandeirantes, os quais levaram milhares de índios para trabalharem como escravos nas lavouras de São Paulo. Após vários ataques em 1637, índios e jesuítas migraram para a região entre o Rio Uruguai e o Rio Paraná. Retornaram para o lado esquerdo do Rio Uruguai a partir de 1682. A República Guarani teve a graça das crianças, uma pureza repleta de candura. E, senhoras e senhores, o mundo novo que estamos procurando realizar não pode menosprezar a lição fornecida. É importante lembrar que o Estado Jesuítico Guarani ocorreu em meio à escravidão exercida no mundo português e as encomendas no mundo espanhol, servindo como área protegida aos nativos que se instalavam nas Reduções. Com o deslocamento das Reduções e a conseqüente exploração dos ervais, madeiras preciosas e estâncias, a região foi se desenvolvendo. A localização final ficou estabelecida com oito Reduções no Paraguai, 15 na Argentina, e sete do lado brasileiro, no noroeste do Rio Grande do Sul, a chamada Região das Missões. O número de habitantes chegou a quase 150 mil. Quanto à agricultura os índios tiveram de abandonar a vida nômade para se fixarem às Reduções e as condições do território para plantio eram excelentes. O clima era saudável. Canais de irrigação levavam a água aos campos. Cada Redução tinha no mínimo oito imensas hortas comunais, os pomares estavam povoados de frutas. Foram concebidas e fabricadas as ferramentas necessárias. Muito rapidamente, as Reduções constituíram o conjunto agrícola mais completo e melhor organizado da América. Quanto à pecuária só São Miguel abatia 40 rezes por dia para o consumo dos habitantes. No princípio produziram vestuário, habitação, ferramentas agrícolas e transportes, as forjas e fundições vieram depois e tiveram muito sucesso. Todas as profissões artesanais tinham sido introduzidas e prosperavam. Fabricavam relógios, clarinetes, trompetes e tantos outros como nas melhores fábricas da Europa. A primeira oficina de impressão da Prata foi da República Guarani. Triunfaram em todas as artes. Nas artes plásticas o Barroco imperou. Mostravam-se sensíveis e acessíveis, possuíam ouvido apurado e um singular gosto pela harmonia. Fundiram o ferro a partir das rochas encontradas na região e chegaram à siderurgia do aço. Aprenderam a tocar todo o tipo de instrumento, compunham músicas. Adoravam o teatro e a dança, organizando grandes apresentações. O jogo de bola recebia todas as atenções, conforme o Padre Cardiel, os guaranis foram efetivamente os inventores do futebol, as bolas eram de borracha, feitas de resina de madeira. Jogavam com os pés. O abastecimento, a armazenagem de produtos e sua distribuição eram assegurados pelos serviços comunais, sem qualquer intermediário comercial privado. A população obtinha os artigos sem dinheiro, nem qualquer espécie de moeda. A profissão de comerciante não existia. O comércio externo era coordenado por um padre que estava em Buenos Aires, o transporte fazia-se principalmente por via fluvial em barcos à vela ou remo. Uma rede de estradas pavimentadas também fora criada. Os principais artigos exportados pelas reduções eram o mate, o fumo, o algodão, o açúcar, os tecidos de algodão, os bordados,... ... as rendas, os objetos trabalhados em torno, mesas, armários, e baús de madeiras preciosas, esculturas, peles, curtumes e arreios de couro, rosários e escapulários, mel, frutas de todas as espécies, cavalos, mulas, e carneiros, assim como e excedente de diversas indústrias. Todos eram vendidos à Europa, Corrientes, Santa Fé e Vila Rica. Importavam produtos manufaturados e metais. Toda a produção era orientada para a satisfação das necessidades do todo. Quanto à questão da propriedade, os bens eram comuns, e não se registrava entre eles litígios nem processos de divisão. Quanto ao trabalho, em regra os Guaranis não trabalhavam mais do que seis horas diárias. De manhã os grupos desfilavam nas ruas e dirigiam-se para o campo ao som da flauta e do tambor,... ... transportando com grande pompa a imagem de Santo Isidro, patrono dos agricultores. Pela tarde, no regresso, cantavam em coro suas canções de marcha. Para a avaliação do trabalho, em geral, bastava acompanhar o ritmo médio. Aquele que não quer trabalhar não deve comer, aquele que não pode trabalhar deve comer. Os velhos, viúvas, órfãos, doentes eram mantidos a expensas da comunidade. A educação recebia uma atenção muito especial, pois dependia a prosperidade da República. Todas as crianças eram obrigadas a ir à escola. A igualdade notava-se pelo vestuário. Homens e mulheres recebiam em princípio, um trajo por ano, as crianças dois. O tecido e o corte eram uniformes para todos. O mesmo princípio de igualdade fazia com que não houvesse pobres entres eles. Em 1750 a República Guarani parecia ter atingido o seu mais alto ponto de esplendor. Porém em 13 de janeiro de 1750 ocorre o Tratado de Madri, que trocava os Sete Povos do lado esquerdo do Rio Uruguai pela Colônia de Sacramento, levando à Guerra Guaranítica. Nesta Guerra, que ocorreu entre os anos 1754 a 1756, morre o Cacique Sepé Tiaraju e tem-se a Batalha de Caiboaté, com a morte de 1500 índios, rompendo a segurança das Reduções, resultando na tomada pelos exércitos de Portugal e Espanha. Senhores e senhoras senadores, A lição ensinada não pode ser esquecida. Hoje em 2007, 240 anos depois do encerramento do projeto procuramos um caminho para a inclusão social e política de índios, negros, pobres, idosos, pessoas com deficiência e tantos outros. Buscamos meios cuidar melhor do meio ambiente. Por isso, não podemos nos esquecer da lição que a história deixou para a vida. Nesta minha ida à região, observei as energias, ainda estão tão presentes, do herói Sepé Tiaraju e de toda a herança que aquele povo esquecido tem para oferecer para o mundo. É verdade que essas histórias fantásticas muitos de nós nem sempre sabemos. Essa é a razão de as contarmos. Senhor presidente, Como já disse aqui em outras vezes, o Cantando as Diferenças vem se tornando ferramenta de luta dos movimentos sociais seja no Rio Grande do Sul, como em outros estados brasileiros. São indígenas; afrodescendentes; mulheres; idosos; pessoas com deficiência; jovens; membros de associações de apicultores e trabalhadores rurais, de sindicatos, de universidades e de escolas públicas e privadas; entre outros. Enfim, muitos são os grupos que vêem no Cantando o que de fato ele pretende: uma forma de inclusão. E é com alegria que vemos esse ideal se expandir. A essência filosófica do Cantando as Diferenças, fortalece-se com essa idéia ao propor a Inclusão do Estado e da sociedade para com as diferenças Culturais, Sociais e individuais. Assim como o reconhecimento político das mesmas, possibilitando alternativas de mudança, através da produção de saberes e atitudes, oportunizando palco para quem não tem palco, ou seja, praticando de fato à solidariedade libertadora e a libertação da liberdade. Finalizo aqui com uma paródia que me foi entregue na sexta-feira pelo professor, Edemar Luiz Steimmetz. Diz ela: “Eu errei mais que podia não compreendendo o diferente Avaliando a todo mundo da mesma forma, Mas descontente. Fui estudando, me reciclando, pedindo ajuda Eu sofri muito, mas aos pouquinhos fui me envolvendo Falei com alguns amigos que nesta luta iam entrando Percebi que todos eles da mesma forma estavam pensando Não é possível que exista hoje alguém que não queira Incluir o humano que de alguma forma é diferente Que excluir que nada, venha pro meu lado Ver o diferente na sociedade valorizado Que excluir que nada, estou mais contente Pois o mais bonito de tudo isso, é o diferente”