Presidente derrubou integralmente oito das 83 leis aprovadas pelo Congresso, maior patamar desde 2003, durante a gestão do ex-presidente Lula
Gabriel Shinohara e Adriana Mendes
21/07/2019 - 04:30
BRASÍLIA — Em relação conflituosa com o Congresso desde a posse, o presidente Jair Bolsonaro vetou integralmente oito das 83 leis publicadas no Diário Oficial nos primeiros 200 dias de mandato, o que representa 9,4% dos projetos aprovados pelos parlamentares e enviados à sanção presidencial. Em anos de primeiro mandato presidencial, o número de vetos chega ao mesmo patamar do período de Luiz Inácio Lula da Silva , que, em 2003, derrubou integralmente 9,7% das leis.
Na comparação com 2018, o percentual é mais de cinco vezes maior. O ex-presidente Michel Temer vetou integralmente apenas duas das 115 leis enviadas para sanção, um percentual de 1,7%. A média de vetos de 2003 até 2018 foi de 5,3% nos primeiros seis meses de governo.
Ao mesmo tempo, Bolsonaro tem recorrido a tomadas de decisão individuais para fazer valer sua vontade. É o recordista em edição de decretos, desde Collor, nos primeiros seis meses de governo. Foram, ao todo, 261.
O levantamento do GLOBO considerou as leis ordinárias e complementares publicadas no Diário Oficial da União até a última sexta-feira, quando Bolsonaro completou 200 dias de mandato. Além dos vetos integrais, o presidente vetou parcialmente 20 projetos e teve dois desses vetos derrubados pelo Congresso. Ainda há nove vetos parciais a serem analisados pelos parlamentares.
O senador Paulo Paim (PT-RS) é autor da uma das propostas vetadas por Bolsonaro — e cujo veto foi derrubado pelo Congresso na última semana. O projeto dispensa a reavaliação pericial de pessoas com HIV/AIDS que se aposentaram por invalidez. Na justificativa do veto, a Presidência alegou que a perícia periódica tem “relevante função de combate a fraudes no âmbito previdenciário”.
— Há uma dissintonia entre o Executivo e o Congresso — afirmou Paim, para quem a derrubada do veto foi demonstração de que a última palavra ainda é do Congresso.
Sem articulação
Também com projeto vetado integralmente, sobre regulação da utilização de cheques em comércios, o deputado Vinícius Carvalho (PRB-SP) disse que conversou com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e com o ministro da Justiça, Sergio Moro, para evitar a rejeição da proposta, mas não adiantou.
Segundo Carvalho, o Executivo explicou que decidiu pelo veto porque a proposta poderia apresentar um “entrave” ao novo cadastro positivo, que tornou compulsória a entrada de todas pessoas físicas e jurídicas em um grande banco de dados de quem tem as contas em dia. Carvalho recorreu aos líderes do governo para que houvesse articulação pela derrubada do veto e recebeu uma resposta positiva, conta. Contudo, o veto se manteve.
— Conversei com a líder do governo no Congresso, conversei com o líder do governo na Câmara dos Deputados e, para minha surpresa, foi colocado lá, de fato, na cédula do governo, a indicação de que era para derrubar esse veto. Mas, pela articulação em plenário não houve de fato um empenho para isso — explicou.
Para a derrubada de um veto são necessários votos da maioria absoluta nas duas Casas, ou seja, a assinatura de 257 deputados e 41 senadores. No caso de uma quantidade inferior de votos pela rejeição em uma das Casas, vence o presidente.
O líder da maioria da Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), também teve vetado na íntegra um projeto de lei de sua autoria. A proposta alterava a Lei do Livro visando descobrir e incentivar novos autores com a realização de concursos regionais e foi vetada com a justificativa que irá “aumentar as despesas públicas”. O líder do PP argumenta que a medida é simples e poderia ter sido sancionada. Mas evitou fazer maiores críticas ao Executivo.
—Para ser justo, o ministro Onyx tem conversado muito com a gente. Tem buscado o diálogo. O governo está em processo de mudanças internas, com novas divisões de funções (na articulação política) —disse o líder, ressaltando que ainda tentará um acordo para derrubada do veto.
Dos outros cinco vetos, quatro são de deputados que não foram reeleitos. Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) é o autor da proposta que regularia a profissão de técnico em imobilizações ortopédicas. Neilton Mulim (PL-RJ) propôs a obrigatoriedade da assistência odontológica para pacientes internados em hospitais. O projeto vetado de Felipe Bornier (PROS-RJ) regularia a profissão de cuidador de idosos, crianças e pessoas com deficiência. Já o de Laura Carneiro (DEM-RJ) criaria Juizados Especiais de Criminais Digitais. A única deputada que foi reeleita, Leandre (PV-PR), propôs a criação do Cadastro Nacional da Pessoa Idosa, que também foi vetado pelo presidente.
FONTE: O GLOBO